Recentemente recebi um elogio de Gustavo
Romeiro sobre a postagem do dia 23 de agosto de 2009 http://capivarapaulistana.blogspot.com/2009/08/tudo-sobre-as-capivaras-que-chegaram-na.html
, e também uma critica na qual faz uma observação esclarecedora sobre a
presença das capivaras em ambientes tão hostis como os centros urbanos, Romeiro
nos mostra que a chegada das capivaras as marginais dos rios Pinheiros e Tietê encontra
melhor hipótese no crescimento populacional da espécie.
Ainda segundo Romeiro “como existe limite
para o número de indivíduos nos melhores habitats, os mais fracos são expulsos
e passam a procurar novos habitats vazios ou com animais mais fracos.
Por isso, a remoção de animais de um lado
para o outro é uma grande crueldade (pois eles serão mortos pelas capivaras
donas do pedaço ou novamente expulsos) e um grande desperdício de dinheiro.
Serve só para mídia mesmo...
A capivara é uma grande presa. Herbívora,
prolífica, sustenta grandes predadores como as onças, cachorros do mato,
grandes aves de rapina, jacarés e sucuris. Evoluiu com essa função ecológica
por milênios, e precisa desse componente, senão sua população aumenta demais e
o estresse faz com que se matem por recursos. A visão romântica de que as
presas são coitadinhos e os predadores são vilões não cabe na natureza. Cada
qual tem sua função e temos que ter a sabedoria para intervir na natureza
racionalmente, para que possamos ter cada vez mais vida em torno de nós”.
A seguir publico na integra seu artigo
sobre o assunto:
SOLUÇÃO DE CONFLITO: A CAPIVARA
(HYDROCHOERUS
HYDROCHAERIS) COMO RECURSO NATURAL
RENOVÁVEL
Por Gustavo Romeiro Mainardes Pinto e Kátia
Maria Paschoaletto Micchi de Barros Ferraz
A capivara é uma espécie nativa que tem
se favorecido pela conversão de áreas florestais para fins agropecuários.
Tal situação tem gerado conflitos com a população humana principalmente
devido aos prejuízos agrícolas e possibilidade de transmissão de doenças.
Entretanto, a espécie apresenta potencial zootécnico e econômico para
sistemas de produção em regime extensivo. Uma futura regulamentação de
manejos extensivos deve amarrar a “outorga” da exploração da fauna à
recuperação ou à conservação ambiental. Tal iniciativa pode melhorar o
quadro ambiental e trazer uma alternativa de solução para o conflito existente,
gerando renda e produção ecologicamente corretas, aproveitando recursos que
hoje o País simplesmente desperdiça.
INTRODUÇÃO E DESENVOLVIMENTO
A capivara (Hydrochoerus hydrochaeris) é
um mamífero herbívoro semi-aquático que possui alta capacidade reprodutiva,
alimentação generalista e pouca exigência quanto à qualidade do habitat. A
conversão de áreas florestais em áreas agrícolas, além de reduzir a
população de seus predadores naturais, aumenta sua área de alimentação
possibilitando o crescimento acentuado das populações de capivaras. Neste
cenário, a espécie vem se tornando um sério problema ao representar riscos
de transmissão de doenças (Pereira & Labruna, 1998) e ao causar prejuízos
à agricultura (Ferraz et al., 2001). A capivara possui potencial econômico
para manejo extensivo, realizado na Venezuela desde a década de 1960 (Ojasti,
1991). Diante dessa situação de conflito, soluções que não onerem ainda mais
os cofres públicos e que possam aliar os diversos setores da sociedade em
torno de um objetivo comum são as que têm maiores chances de sucesso.
Analisando a ecologia da capivara, verifica-se uma complexa organização social
que reduz a produtividade e aumenta custos, inviabilizando sua criação em
cativeiro. Assim, o sistema produtivo mais viável econômica e ambientalmente
para a capivara seria o extensivo, realizado através do manejo adaptativo ou
de controle (Caughley & Sinclair, 1994). Por outro lado, vemos que matas
ciliares são artigos raros no sudeste do Brasil, apesar de todo o aparato
legal (Lei Federal no 4.771/65 e Resolução CONAMA no 303/2002). A pressão
dos setores sociais envolvidos exige soluções, geralmente condenando a
espécie perante a opinião pública, o que pode servir de mote para ações
ambientalmente desastrosas. Ainda, fazendo uma análise um pouco mais profunda,
podemos concluir que praticamente toda a proteína animal produzida no País,
excetuando-se o pescado, provém de áreas que um dia foram florestas e que
foram convertidas à agropecuária.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A legislação que dispõe sobre a fauna
nativa foi criada numa época em que o conceito de uso e conservação dos
recursos naturais praticamente inexistia, sendo quase uma unanimidade que a
proteção repressiva seria a única forma de evitar a perda de biodiversidade
(Lei Federal no 5.197/67). Dessa forma, a letra da lei é bastante restritiva,
inviabilizando o manejo extensivo da fauna na natureza. Entretanto, os fatos têm
mostrado a necessidade de elaboração de novas normas que busquem não somente
evitar a continuidade da degradação ambiental, mas sim reverter esse quadro,
visando a recuperação de áreas hoje degradadas e a produção agroecológica.
Uma proposta de solução para o conflito que envolve a capivara basear-se-ia
primeiramente na definição de bacias hidrográficas onde este esteja
estabelecido e exista viabilidade ecológica e econômica de manejo extensivo de
capivaras. Definida a bacia, proceder-se-ia a uma avaliação das populações,
classificando-as em:
1) áreas-núcleo, com maiores densidades
populacionais, alta taxa de natalidade e baixa taxa de mortalidade, as quais
poderiam estar dispersando o excedente populacional para outras áreas; e,
2) áreas-marginais, com baixa taxa de
natalidade e alta de mortalidade e que poderiam estar recebendo o excedente
naturalmente. O manejo seria realizado nas áreas-marginais, enquanto que as
áreas-núcleo seriam preservadas de qualquer intervenção. As estimativas
populacionais dos grupos manejados podem ser obtidas pela técnica de
Índice-manipulação-índice, o que reduz substancialmente os custos, devendo
servir como base para definir as ações de manejo subsequentes, baseando-se nos
conceitos de máximo rendimento sustentável (Begon & Mortimer, 1986;
Caughley & Sinclair, 1994). O monitoramento sistemático da flutuação
populacional das áreas-núcleo trazem segurança ao sistema e maior proteção
àquelas populações. Uma resposta do Estado (especialmente São Paulo, onde a
situação é mais grave) a essa demanda social pode ocorrer de maneira mais acertada
caso haja uma implementação experimental desse manejo, permitindo que
inevitáveis ajustes possam ser verificados antes, para poderem constar de uma
futura regulamentação, que necessariamente condicione tal atividade a uma
contrapartida ambiental que seja, no mínimo, a adequação ambiental da
propriedade ao Código Florestal, o que colaboraria, inclusive, para amenizar
os problemas decorrentes do desequilíbrio ambiental.
Gustavo Romeiro Mainardes Pinto ; Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, Área de
Proteção Ambiental do Anhatomirim
Av. Mauro Ramos 1113, Florianópolis, SC
Tel. (48) 282-1863, E-mail:
gustavo.pinto@ibama.gov.br
Kátia Maria Paschoaletto Micchi de Barros
Ferraz
Laboratório de Métodos Quantitativos,
Departamento de Ciências Florestais, ESALQ/USP
Caixa Postal 09, 13418-900, Piracicaba, SP
Tel. (19) 3436-8676, E-mail:
kferraz@esalq.usp.br
LITERATURA CITADA
Begon, M.; Mortimer, M. Population Ecology.
A Unified Study of Animals and Plants.
Second edition. Blackwell Scientific
Publications, Oxford, U.K, 1986.
Caughley, G.; Sinclair, A.R.E. Wildlife
Ecology and management. Boston: Blackwell
Scientific Publications, 1994. 334p.
Ferraz, K.M.P.M.B.; Santos-Filho, R.M.F.;
Piffer, T.R.O.; Verdade, L.M. Biologia e manejo
da capivara: do controle de danos ao máximo
rendimento sustentável. In: Mattos,
W.R.S. (Ed.) A produção animal na visão
dos brasileiros. Piracicaba: FEALQ,
2001, p.580-588.
Ojasti, J. Human exploitation of capybara.
In: Robinson, J.G.; Redford, K.H. (Ed.).
Neotropical wildlife use and conservation.
Chicago: The University of Chicago
Press, 1991, p.236-254.
Pereira, M.C.; Labruna, M.B. Febre
maculosa: aspectos clínico-epidemiológicos.
Clínica Veterinária, III (12): 19-23,
1998.
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